Hospital

A manhã dissipou-se levando consigo uma grande vergonha e mais uma vez os meus poderes encontravam-se descontrolados, deixando-me humilhada perante aqueles que não me percebiam.
O meu almoço passou-se na companhia do meu animal, que por esta hora já se encontrava a dormir ao contrário de mim que vagueava pelas ruas, refletindo toda aquela minha manhã apoquentada. Ao olhar para a estrada dava para sentir todo aquele frenesi citadino, procurava entre todos os veículos um táxi desocupado, que a esta hora parecia ser uma missão irrealizável. O cheiro das emissões das viaturas era algo que me dava a volta ao estomago, estendi a minha mão mal um táxi passou por mim, porém esse sequer parou dois segundos dirigindo freneticamente para uma outra rua à qual eu não sei o nome.
Num ato de conformismo suspirei para mim mesma, peguei no meu smartphone e rapidamente tateei em direção ao gps que por longos 30 minutos a pé me levou ao hospital. Local onde iria estudar e estagiar durante algum tempo. Mal avistei o relógio corri para a sala onde supostamente já teria que estar e bati duas vezes na mesma fechando os olhos e o punho com medo da reação do outro lado da porta.

Estava cansado, simplesmente cansado. Estava a ser um dia demasiado longo no trabalho, raramente tinha dias assim tão pesados mas este, infelizmente, estava a ser um deles. Passei os dedos pelo meu cabelo enquanto andava apressado pelo longo corredor, despido de qualquer cor, depois de ter ido ver mais um paciente. Tinha tantas e tantas coisas para fazer ainda durante este dia, uma delas era receber uma nova estagiária no hospital, porque é que tinha de ser eu a fazê-lo e não um outro médico qualquer? Não sabia a resposta para esta pergunta e isso também não interessava sequer.
Abri a porta do meu gabinete e fechei-a atrás de mim sentindo-me deveras reconfortado pelo baixo barulho da porta a ser fechada. Ia ter uns breves minutos de descanso, iam ser poucos, mas era muito melhor do que nada. Olhei o relógio que tinha no pulso apercebendo-me de que a nova estagiária já estava um pouco atrasada. Bufei, revirando os olhos e nesse mesmo instante ouvi um suave bater na porta.
- Sim? - foi a única coisa que perguntei.

A sua resposta pareceu demorar, aliás pareceu uma eternidade no meio de todo aquele desconforto e embaraço. Olhei á minha volta analisando atentamente todos os pequenos detalhes escondidos por trás de todas aquelas pessoas sofridas, fitei a porta azul-turquesa e baixei o olhar vagarosamente colocando a mão na maçaneta da porta, tão fria fazendo-me até arrepiar. Com um pouco de força abri-a e invadi o seu gabinete, sentido logo a mudança de olor. O seu perfume pairava no ar fazendo-me por segundos concentrar-me só nele, antes de mirar o senhor que certamente me encarava neste instante. – Boa tarde. – cumprimentei-o, fechando a porta num gesto rápido e lancei a minha mão para junto da dele esperando uma reação da sua parte.
O tempo parecia ter parado para eu me dar conta de todos as suas minúcias faciais. O seu maxilar era forte, perfeitamente estruturado que conjugava tão bem com os seus lábios avermelhados e delineados que suplicavam para serem beijados. O olhar frio azulado dele rogava desprezo completo o que lhe dava uma certa piada até. Se bem que eu neste momento o respeitava por ser meu superior.
Eu apenas suplicava para que os meus poderes não se descontrolassem em serviço, muito menos a frente dele. Rapidamente iria acabar com a minha carreira, e todos estes largos anos de estudo iam por água abaixo.

No instante seguinte a aquela palavra me sair da boca a maçaneta da porta rodou e esta foi aberta, levantei o meu olhar para a porta, visto ter-me distraído por momentos com uma outra coisa qualquer, e fitei a rapariga que repentinamente tinha surgido no meu campo de visão. Levantei-me, tentando reagir e não ficar apenas ali especado olhando-a, estendi a minha mão para apertar a mão que ela me estendia. A sua pele era suave e delicada demais e depois de me demorar um pouco naquilo larguei-lhe a mão e deixei a minha cair ao lado do meu corpo.
- Boa tarde. - proferi também em forma de cumprimento e abanei ligeiramente a cabeça tentando recompôr-me. Não estava à espera que me aparecesse alguém assim tão... sei lá, tão diferente do que eu esperava que fosse. - Pode sentar-se. - acabei por dizer depois de afastar da minha mente aqueles pensamentos. - Calculo que seja a nova estagiária aqui do hospital. - disse olhando-a e peguei numas folhas rabiscadas que alguém tinha deixado na minha secretária algures durante aquele dia, baixei o meu olhar para as mesmas. - Desire Evans? - perguntei para confirmar o seu nome, era aquele que constava na papelada.

Inevitavelmente o meu olhar seguiu minuciosamente todos os movimentos que o seu corpo ia fazendo à medida que ela se sentava e depois cruzava as pernas uma sobre a outra. Conseguia perceber, apenas por aqueles movimentos, que ela era delicada e bastante elegante também. O meu olhar seguiu para o seu rosto assim que ela falou novamente e fitei por momentos os seus olhos azuis penetrantes, acho que nunca tinha visto uns olhos assim. Sentia que podia ficar durante horas apenas a fitá-los que não me cansaria de o fazer.
- Penso que já a informaram das funções que irá desempenhar enquanto estagiária aqui no hospital durante os próximos meses, certo? - falei para quebrar o silêncio que eu próprio tinha criado ao estar meio distraído. Passei os dedos pelas folhas e depois peguei numa caneta que ali tinha na secretária, estendi a folha pousando-a em frente dela e estendi igualmente aquela caneta. - Preciso que depois assine aqui. - pedi, eram apenas algumas formalidades do hospital.

O nosso olhar prendia-se com facilidade o que me deixava um pouco desconfortável. Aquele homem transpirava sensualidade, acabei por suspirar de forma muito discreta. Os nossos olhos ao contrário dos nossos corpos imóveis pareciam não se cansar de se envolverem num mar azul, numa dança profunda, como se de uma noite de sexo se decorresse entre eles. O silêncio entre ambos foi morto pelo outro individuo que neste momento partilhava a sala comigo. - Penso que já a informaram das funções que irá desempenhar enquanto estagiária aqui no hospital durante os próximos meses, certo? – perguntou, sinceramente não acho que o tenha feito para realmente saber, mas apenas para acabar com aquele silêncio que imperava. --Ah, mais ou menos. Como deve saber estou no meu terceiro ano de faculdade, e este estágio serve mais para aprender a parte mais prática…não me explicaram bem o que irei fazer.- Apressei-me para responder antes que perdesse todo interesse na questão e fitei-o atentamente. – Ainda não se apresentou.- Decidi meter-me com ele num tom de clara brincadeira, que não se percebi muito bem. É um pouco difícil se desvendar o meu estado apenas com as palavras, tem que se batalhar para me perceber bem. Ao pegar no papel que me deu antes de pronunciar qualquer tipo de coisa o meu olhar rapidamente devorou a informação a frente, fitei-o esperando que me dissesse o que fazer. - Preciso que depois assine aqui. – Assenti e peguei no papel assinando rapidamente onde precisava de o fazer. – Sabe que a probabilidade de me perder aqui é muito grande, como meu orientador de estágio devia fazer-me uma visita guiada ao hospital. – Sugeri deixando escapar um sorriso irónico. Parecia tão cansado, galhofei mentalmente.

Juro que não me cansava de olhar para os olhos dela assim como me apercebi que ela fazia o mesmo, fitando constamente os meus olhos também. Tentei desviar o olhar por várias vezes para assim tentar manter a minha compostura, mas era um pouco difícil de o fazer visto que eu gostava de manter o contacto visual com as pessoas com quem estava a manter uma conversa. Assenti levemente com a cabeça à explicação que ela me dava.
- Muito bem, depois irei explicar melhor quais serão as tarefas. - disse e pela primeira vez desde que ela ali tinha entrado, deixei que um leve sorriso aparecesse nos meus lábios quando ela falou de ainda não me ter apresentado. - Peço desculpa. - pedi olhando-a. - Chamo-me Brad Walker. - apresentei-me por fim e depois de ela assinar as folhas recolhi as mesmas e pousei-as ao meu lado não sem antes olhar de relance para a sua letra bem desenhada. Juntei as minhas mãos uma à outra e remexi-as assentindo novamente com a cabeça. - Claro que irei fazer isso. - afirmei. - Só uma coisa, pode tratar-me por "tu"? - perguntei, não gostava nada que me tratassem de maneira tão formal pois isso fazia-me sentir bem mais velho do que aquilo que eu realmente era. - Se poder, podemos passar agora à parte de conhecer o hospital. - disse-lhe.

Os nosso olhos dançavam os dois, numa dança lenta, sedutora. Discretamente molhei os meus lábios passando a minha língua vagarosamente pelo meu lábio inferior, olhei atentamente para ele que me encarava de igual forma. A sua presença deixava-me com calor e os meus poderes fervilhavam dentro de mim. Algo sem explicação. - Muito bem, depois irei explicar melhor quais serão as tarefas. –Mais uma vez a sua voz grave fez-se ouvir, acabou por sorrir, um sorriso leve mas extremamente erótico, que deixava qualquer rapariga a tremelicar. Passado poucos segundos o seu nome fez-se ecoar no quarto, proferindo por Brad que se acabara de apresentar.
Absorvi-me dele e olhei atentamente para o seu gabinete tentando assimilar todo o ínfimo pormenor que ali constava.- Eu adorava trata-lo por tu, mas…temo que seja pouco profissional. – os meus olhos faziam um esforço para se encontrarem com os dele, ao contrario da vontade que tinha de não o fazer. Levantei-me, dando resposta a sua sugestão. Mal o fiz bati sem querer no seu pisa papéis de vidro que quase caia, num gesto rápido e impulsivo estendi a mão deixando que os meus puderes fluíssem fazendo com o que pisa papeis flutuasse no ar. Quando dei conta do mesmo estremeci e recuei dois passos batendo com as costas na porta, esta que estremeceu. Estava novamente descontrolada e as luzes começavam a apagar e a acender. Olhei para ele e baixei o olhar sentindo-me a tremer e com um pouco de vergonha pelo sucedido.

Tentei desviar por várias vezes os meus olhos dos seus mas todas elas eram tentativas falhadas. Assenti com a cabeça ao que ela disse como que a concordar com ela.
- Pois, tem razão. - deixei de novo que um sorriso surgisse nos meus lábios e tal como ela eu levantei-me da cadeira onde me encontrava sentado. Quando me preparava para começar a andar para que saissemos do meu gabinete, algo de muito estranho se sucedeu, todos aqueles acontecimentos ficaram confusos na minnha cabeça e várias vezes pisquei os olhos enquanto me concentrava em Desire e no que se estava a passar. Só encontrava uma única explicação para aquilo e muito sinceramente, não conseguia acreditar que essa fosse a explicação certa. Só uma bruxa conseguiria fazer aquilo que ela estava a fazer, e eu sabia isso, porque eu era um desses seres. Por mais que detestasse esse facto não podia mudá-lo e tinha de viver com aquilo. Fitei-a e olhei o seu rosto que apenas deixava transparecer vergonha e talvez uma pitada de medo. Engoli em seco e a medo fui-me aproximando dela, meio perplexo e com medo de dizer o que quer que fosse. - Tu és... - comecei a falar mas logo me calei impedindo-me de dizer a palavra que me bailava nos lábios.

Eu parei o carro mesmo em frente à porta das urgências. Fiz sinal mal saí do carro mas o estúpido segurança limitou-se a dizer que não podia parar ali, ao invés de chamar alguém. Ignorei-o e cuidadosamente tirei Savannah do carro. Com ela ao colo, segui para dentro do hospital - Alguém que a ajude! - Aí sim apareceram enfermeiros que a encaminharam logo para uma maca.

*Savannah off*

Com toda aquela perda de sangue Savannah tinha desmaiado.. Era fraca em relação a doenças e nem sabia como tinha feito o corte.
Foi levada para dentro e Ash ficou-se pela sala de espera. Levaram-na para a sala de operações para fechar a facada que tinha na barriga, levando três pontos na barriga.

Acabei por ficar no hospital, na sala de espera. Queria apenas assegurar-me de que ela estava bem. Olhei para a minha camisa, manchada com o sangue dela. Parecera-me que ela perdera muito sangue.
Quando uma enfermeira passou pela sala, abordei-a.
- Savannah Evans? Já saiu da sala de operações. Conseguimos estabilizar a situação. Encontra-se no recobro - Agradeci à enfermeira pela informação.
Agora posso ir-me embora, pensei. Contudo dei meia-volta pelo hospital e tentei encontrar o quarto onde ela estava.

*Savannah off*
Savannah estava agora a soro, pois estava muito fraca. O hospital estava cheio e não podiam acolher mais pacientes, Savannah tinha de sair assim que acorda-se. Não se podia levantar da cama e teria de ter muitos cuidados.

Um dos médicos informara-me da situação dela, tanto a física como a outra - o facto de ter de sair do hospital, sem sequer estar recuperada! Era uma vergonha. Quase me deu vontade de o esmurrar ali e obrigá-lo a criar espaço para ela.
Adiante, fui até à maca onde ela estava alojada.

*Savannah On*
Abri os meus olhos lentamente e comecei por ver tudo desfocado.. Não sabia onde estava, apenas via uma coisa branca ao cimo, talvez um tecto.. mas onde estaria eu?

- Savannah? - Dei um passo em frente quando percebi que ela estava a acordar. - Sentes-te bem? - pergunta estúpida de se fazer numa situação daquelas.

Conhecia aquela voz.. Tentei virar a cara lentamente para onde vinha o som. - Onde estou? - foi a primeira coisa que perguntei com uma voz rouça.

Ela ainda devia estar um bocadinho desorientada por causa da cirurgia.
- Estás no hospital. Saíste da cirurgia há pouco mais de umas horas. Queres que chama um médico?

A faca que me tinha espacapado era isso... -Não. - acabei por lhe responder passado um pouco e fechei novamente os olhos. Sentia-me fraca.

Sabia que não me devia meter no assunto mas era melhor informá-la antes que o médico empertigado o fizesse - houve, Savannah, tens um problema... o hospital está com falta de camas. Daqui a pouco tempo vão dar-te alta e mandar-te embora. Eu tentei fazê-los mudar de ideias mas não deu.

Voltei a abrir os olhos, um bocado assustada quando ele disse aquilo. Eu estava aqui sozinha, estava bem tramada. - Podes só levar-me para minha casa então? Se não for pedir muito... - acabei por pedir, apesar de odiar que me fizesse favores.

- No problem. Eu levo-te a casa - Não custava nada. Ainda por cima íamos para o mesmo sitio.

- Obrigada. - agradeci logo. Vi outra pessoa aproximar-se, era o médico. - É o namorado? - ouvi-o perguntar, certamente para Ash.